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segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

PALPÉRRIMO*

Sem ter absolutamente nada, Antônio sai de casa às cinco horas da manhã para procurar emprego. Sem qualificação e sem nunca ter tido carteira assinada, vivia de "bicos" que conseguia arrumar por aí. Era o típico nordestino, que desembarcara em São Paulo, sonhando com dias melhores.
Hoje, pai de cinco filhos, via a angústia de sobreviver das esmolas e das migalhas que jogavam em seu chão. O filho maior tinha seis anos e o menor, apenas 2 meses.
A mulher, com os seios flácidos, estava ali, sentada na beira da cama, pensando o que iria dar para os filhos se alimentarem.

Antônio, muitas vezes, andava o dia inteiro. Era homem que não temia trabalho. Era jardineiro, encanador, mecânico, borracheiro, eletricista, soldador, carpinteiro, marceneiro, pedreiro, pintor. Tudo o que a vida ensinou. Era forte, dotado de músculos e de uma gentileza irreconhecível nos dias de hoje. Às vezes, ganhava o suficiente para o pão e o leite das crianças. A mulher, por causa dos filhos pequenos, não trabalhava. Apenas cuidava do barraco onde moravam. Casa pobre de apenas dois cômodos. O banheiro ficava na parte de fora do barraco, o que expunha todos às mais diversas e possíveis doenças. Os móveis, em sua maioria foram achados nas muitas andanças de Antônio por aí. Não tinham televisão. A luz elétrica era puxada do poste da avenida central e nunca, nunca veio alguém para reclamar. A água era também puxada dos diversos canos e emendas. Cada barraco recebia um filete apenas de água. O banho era em canecas de água. Uma vida com certeza injusta, diante de tudo o que já havia passado. Mesmo assim, a fé parecia ser inabalável.
Antônio não conhecia ninguém nessa megalópole chamada São Paulo. Male má conhecia os vizinhos. Moravam em uma dessas milhares de favelas. Uma vida de sacrifício. Não havia prazer algum. A não ser o prazer de estarem todos reunidos quando a noite chegava. Antônio era um pai dedicado. Adorava fazer os filhos menores darem risadas. Colocava-os para dormir e se espremia na cama com a mulher. Naquele momento, parecia enfim que eram um só.
De manhã antes de sair, café preto quando havia e pão seco. Os dias se faziam dessa maneira. Algumas vezes, a mãe era obrigada a sair com os filhos pequenos para pedir comida. Algumas pessoas caridosas doavam alimentos, doavam roupas. A vida se desenhava de modo amargo.
Naquele dia, Antônio não tinha dinheiro para pegar o ônibus. Tinha que ir a pé. Eram pelo menos cinco quilômetros até o centro da cidade. Pensou que podia conseguir algum emprego, fazer algum "bico". Andava com suas ferramentas de jardinagem. Era o que mais conseguia; cortar o mato de algum jardim. Mas a sua aparência não ajudava muito. Estava abatido. As roupas estavam surradas. Os sapatos sujos e quase todo remendado. Não passava muita confiança. As pessoas cada vez mais escravas da boa aparência.
Antônio estava cansado. Parou em um bar e pediu um copo de água. Aquela água refrescava e dava mais força. Não pensava como iria voltar. Queria apenas garantir o pão das crianças e quem sabe o leite, o arroz, um pacote de bolacha. Sua mulher se humilhava mais. Antônio preferia oferecer trabalho a esmolar. Por isso, muitas vezes voltava para casa sem nada. Quantas vezes dormiu com fome para não tirar o pouco das crianças.
Estava passando em frente de uma bela casa, com um enorme jardim. Resolveu tocar a campainha e oferecer seus serviços como jardineiro. Demoraram um pouco para atender. Percebeu que tinha gente na casa, pois sentiu que o espiavam da janela. Antônio pegou a tesoura de cortar grama e mostrou. Um sinal fez com que aguardasse. Da lateral da casa, surge um velho senhor arrastando os passos.
- Pois não!
- Oi, eu faço trabalho de jardinagem...

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