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quinta-feira, 26 de agosto de 2010

DE NOVO

Eu queria apenas voltar para casa.
A saudades de tudo estava forte demais. Não via a hora de encontrar meus filhos, minha casa. Precisava voltar para minha vida.
Recomeçar de onde havia parado. Aqueles anos longe mudaram minha maneira de ver a vida. Não queria mais nada daquilo.
Fui condenado a mais de 25 anos de cadeia. Crime? Homicidio.
Eu amava demais minha mulher. Cheguei em casa um dia e vi um homem conversando com ela no portão de casa. Fui tomado pelo ciúmes. Hoje sei que não havia motivos. Vilma sempre fora uma mulher carinhosa, fiel, mãe exemplar, esposa carinhosa. Naquele dia nada disso me fez parar. Vendo o sorriso estampado em seu rosto, sentindo a proximidade dela com aquele homem no portão da minha casa, fiquei cego, louco. Senti um torpor forte. Parei e fiquei imaginando tudo. Minha mulher se entregando para aquele homem nas horas que eu não estava. Meus filhos correndo ao seu encontro e dando para ele o amor que era meu. Imaginei ele na minha cama, comendo na mesa com minha família a única razão que eu tinha para me sentir vivo e forte. Parei e fiquei ali, olhando a cena enquanto era consumido por inteiro por todos os piores sentimentos. Vi o exato momento que ele se aproximou e a abraçou beijando-lhe a fase. Se despediu e partiu deixando-a com o sorriso no rosto.
Cheguei em casa e não disse nada. Ela também não me falou nada. Não me disse quem era aquele homem que parecia ser íntimo demais.
Tentei agir da maneira mais natural possível. Dias se passaram e tudo para mim era motivo. Desconfiava de tudo. Já não conseguia olhar para ela
como sempre. Ela era pra mim uma vaca, uma vagabunda que apoveitava o momento em que eu não estava em casa para se entregar para outro
homem. Não pensava em mais nada. Comecei a não render no emprego. Andava todos os dias de péssimo humor. Comecei a me fechar e a enlou quecer sozinho. Cada vez mais calado. Nem meus filhos me faziam rir. Achava que eles eram cumplices.
Um dia, não estava passando bem, acabei voltando mais cedo para casa. Vilma não estava. As crianças estavam na escola e a casa para mim estava largada como se alguém derrepente saisse correndo. Fui para o quarto. A cama estava arrumada mas com a nítida impressão que alguém
se deitou nela, deixando marcas na colcha. No banheiro, a sensação que alguém havia acabado de tomar banho. Os frascos de perfume estavam abertos na penteadeira como se Vilma acabasse de usá-los e com pressa saiu sem tampá-los. Comecei a vasculhar tudo em busca de vestígios. Ela
havia deixado o telefone celular. Olhei e vi suas últimas ligações recebidas. Olhei suas mensagens:
- Passo na sua casa daqui a meia hora. Me espere no portão. Paulo.
Havia um número de telefone. Claro que eu liguei. Claro que caiu na caixa postal. Ela recebeu a mensagem as 14:00hs. Meus filhos entravam na escola as 13:30 e era ela que deixava meus filhos na escola. Por isso a pressa em se arrumar. Sai desesperado. Não via nada. Não via ninguém. Tive vontade de acabar com minha vida, tive vontade de acabar com tudo. Fui envolvido por todos os piores sentimentos. Raiva, ódio, magoa, uma fúria descontrolada. Queria me vingar. Pensava em tudo. Peguei o carro e fui para o centro da cidade. Estava cego.
Deixei o carro estacionamento e sai. Não via nada. Nem ninguém. Via apenas Vilma se entregando para aquele homem. Via ele possuindo a mulher que era minha. Vi sua cara de prazer. Parei em um bar. Eu nunca havia parado em um bar. Pedi uma bebida forte. O rapaz do balcão me serviu um conhaque. Aquele líquido queimou as últimas sensações de bondade que haviam em mim. Decidi matá-la. Tomei mais algumas doses de conhaque.
Mais umas e umas. Comecei a me sentir forte, imbatível. Sai dela com a boca amarga. Cheio de ódio.
Quando cheguei em casa ela ainda não estava. Fui para o meu quarto. Abri o cofre, peguei o revólver calibre 38, coloquei as seis munições e fui para a sala. Apaguei as luzes. Fechei as cortinas. Sentei e esperei. Não era mais eu que estava lá.
18 horas e vinte cinco minutos. Escuto Vilma chegar. Assim que ela abriu a porta e acendeu a luz, descarreguei toda minha fúria. Dei seis tiros na mulher que eu mais amava. Meus filhos estavam com ela. Viram a mãe cair praticamente aos meus pés. Lágrimas cairam. Meus filhos debruçados
sobre a mãe choravam desesperados. O barulho chamou a atenção dos vizinhos. Sentei e esperei a policia chegar. Sai de lá, deixando minha mulher morta, meus filhos sem pai e agora sem mãe. Dias mais tarde fiquei sabendo que aquele homem era apenas um vendedor. Ele passou em casa para ir com minha mulher até a loja para justamente escolher o meu presente de aniversário. No dia que eu os vi em casa, ele havia levado um catálogo para que minha mulher pudesse ter a idéia do que me dar de presente de aniversário de casamento.

domingo, 15 de agosto de 2010

MUROS

Se eu pudesse voltar atrás, queria que tudo fosse como antes, em que podíamos conversar sem qualquer pretensão, sem agressão. Éramos sim amigos despretensiosos.Queríamos apenas estar. Mas aos poucos tudo ficou pesado. As palavras ficaram amargas. Começou a se querer muito. Começaram a existir culpas e culpados. A amizade se perdeu. Feriu-se. Deixamos de nos ver como nos víamos. Deixamos de ser amigos. Ficamos preocupados em medir força. Força desnecessária. Perdemos a essência.Tenho sim saudades do tempo que passávamos horas e horas falando. Eram dias e tardes. Eu ria, sorria. Sentia-me bem. Não havia intenção nas palavras. Não havia necessidade de se cobrar nada. Tudo isso se perdeu. Abrimos-nos demais e nos perdemos. Se eu pudesse voltar no tempo, voltaria no exato momento em que nos conhecemos e nos falamos pela primeira vez. Iria apenas falar de poesia, iria apenas falar das cantigas. Iria pegar o seu melhor e somar a minha vida.Hoje, achamos que nos conhecemos demais. Hoje, achamos que podemos demais. Hoje, perdemos tudo por nossa culpa.Ficamos preocupados com os pensamentos. Tudo ficou pesado. Articulado. Presos nas armadilhas que criamos. Conhecemos-nos sem nos conhecer. Sinto sim, falta da amizade que um dia tivemos. Era bom demais conversar despretensiosos. Havia a necessidade do bom dia. Havia o desejo de compartilhar, de compactuar por que é disso que é feito a amizade.Hoje, não somos mais libertos. Há culpa, há dor, magoa, cicatrizes que ainda sagram e saberá Deus ainda por quanto tempo ira sangrar. Se eu pudesse voltar atrás, voltaria. Amei o momento que vivemos. Foi lindo. Foi nosso. Foi inesquecível. Não nos conhecemos mais ou nos conhecemos demais ou ainda achamos que nos conhecemos e foi nesse exato momento que nos perdemos. Perdemos o sentido de tudo. Viramos o oposto do que queríamos. Armamos-nos e atacamos sem se importar com o que estava sendo perdido. Colocamos-nos a frente de nós mesmos e perdemos. Começamos então a desfazer tudo o que foi criado. Começamos a desmontar sem perceber a ponta que construímos e passamos a erguer um muro intransponível. Usamos tudo de nós contra nós mesmos. Tenho saudade sim dos dias que conversávamos despretensiosos sobre tudo. Falávamos de amor, de paixão, falamos de poesia.Tudo isso bastava e era isso que eu queria. Mas as peça de uma máquina se desgastam. As engrenagens empenam. E assim foi conosco. Sete anos, todos os dias, falando, nos dando, exigindo de nós sempre mais e mais. Começamos a nos arranhar, a nos machucar e nem percebemos que aos poucos, já não éramos mais o mesmo.E não somos mais os mesmos. Já não sabemos mais nada de nós. Cada dia um tijolo no muro que nos separava. Hoje não sei mais nada de você e você não sabe mais nada de mim. O muro se ergueu alto demais. Ouvimos apenas nossos gritos. O som oco de nossa voz. Aos poucos se tudo continuar assim, logo nossa voz será abafado pelos nossos gritos e não mais nos escutaremos. Tenho saudade sim, dos amigos que fomos um dia. Hoje não me conheces e eu já não te conheço mais. Cada dia, um tijolo. Cada dia, cada vez mais, nossa voz apagada. Restará somente, as mãos calejadas, os tijolos e a lembrança do que já fomos. Se eu pudesse, voltaria atrás no exato momento em que nos conhecemos.