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sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

VOZ DE DEUS*

Sempre levei uma vida dura. Vida de muito trabalho. Não acreditava em Deus e nem podia, diante da minha vida sofrida.
Naquele dia, sem saber o porque, minha mulher resolveu ir para a casa da mãe com meus quatro filhos. Eu não concordei muito, pois eu queria passar a noite de Ano Novo com meus filhos.
Mas, como a nossa situação era precária, aceitei. Porém, disse que não iria junto. Eu ia passar sozinho, dormindo. Comi um pedaço de frango que ganhei de um vizinho e bebi um pouco de tubaina. Fiquei olhando a chuva. Meu barraco ficava no pé do morro. Eu nem queria ver mais os fogos de final de ano. Era a mesma coisa que ver as pessoas queimando dinheiro. Comi e fui me deitar. Não sei se chovia mais dentro de casa ou do lado de fora. Fiquei por um bom tempo ouvindo o barulho da chuva nas telhas. Acabei dormindo.
Sonhei com meus filhos. Estávamos reunidos em torno de uma mesa farta. Todos vestidos de branco. Minha mulher, como sempre, sorria muito. Meus filhos estavam felizes. Comiam e bebiam. No meu sonho eu não me via, mas sentia uma enorme paz e alegria. Depois da ceia fiquei sentado à mesa e vi meus filhos correndo pela casa, brincando. Todos foram para a varanda olhar a queima de fogos. O céu estava claro, iluminado por uma lua linda. Foi então que escutei minha mulher me chamar. Sua voz era nítida e forte. Chamava-me para ver os fogos. Queria que eu estivesse junto na virada do ano. Acordei com uma voz me chamando do lado de fora do meu barraco. Chamava meu nome. Chamava sem parar. Parecia desesperada. Coloquei a camisa e saí. Não havia ninguém. Cada vez mais ouvia claramente a voz me chamar. Logo que saí para o quintal, os fogos começaram a clarear o céu. Chovia muito. Eu fiquei ali sem saber o que fazer. Olhei para o céu iluminado e foi então que escutei um estrondo e vi meu barraco ser engolido pela terra que deslizou do morro. Fiquei ali, vendo a terra destruir o pouco que eu tinha.
Ajoelhei e agradeci pelos meus filhos que não estavam ali. Chorei pela minha mulher e agradeci a voz de Deus que me tirou dali naquele exato momento.
Logo eu, que não acreditava em Deus, via-me agora de joelhos agradecendo pela vida.

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